O futebol é uma das maiores forças culturais do nosso tempo. Em Portugal, move multidões, gera milhões e desperta emoções como poucas outras realidades. Contudo, com grande influência, vem também uma grande responsabilidade, e é legítimo questionar se o futebol está a usá-la da melhor forma.
A sua presença vai muito além das quatro linhas. Está nos bairros, nas escolas, nas conversas do dia a dia. É uma linguagem universal, um ponto de encontro entre gerações, classes e mundos diferentes. Ainda assim, apesar deste alcance, a responsabilidade social no futebol continua, na maioria das vezes, uma nota de rodapé.
Existem poucas estratégias de longo prazo que liguem os clubes às comunidades de forma profunda. São comuns ações pontuais, como torneios solidários, visitas a instituições, campanhas sazonais, mas raramente se vê um compromisso estruturado com o desenvolvimento social. Numa sociedade onde mais de 1,7 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza, com jovens sem autonomia e famílias a sobreviver com o mínimo, esta deveria ser uma prioridade.
O futebol tem o potencial para ser um ator social poderoso: pode gerar oportunidades educativas, promover a inclusão, combater estigmas e criar referências positivas. Não se trata de transformar clubes em organizações de solidariedade, mas de reconhecer que o impacto social não é um extra, é parte integrante da missão de qualquer instituição com tanto poder e visibilidade.
Com mais de vinte anos de experiência como árbitro de futebol e dirigente associativo na arbitragem, tive a oportunidade de ver de perto o potencial transformador do futebol nas comunidades. No entanto, também testemunhei as limitações e o pouco aproveitamento desse poder em prol da responsabilidade social. Esta vivência reforça a minha convicção de que o futebol pode e deve assumir um papel mais ativo e estruturado na promoção da inclusão, da educação e do apoio social, não apenas dentro de campo, mas sobretudo fora dele.
Há um jogo que ainda não começou verdadeiramente: o da responsabilidade social com intenção, continuidade e impacto real. E esse jogo é urgente.
João Ricardo Silva (Coordenador Projetos Sociais)