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«O investidor quer fazer o papel de presidente, director desportivo e treinador»

Nuno Borges explicou ao Desportivo on-line as razões que o levaram a abandonar o Palmeiras, arrastando consigo mais 10 jogadores. O treinador diz que tinha «uma sombra permanentemente nos treinos e nos jogos» e que não admite que interfiram «na esfera do seu trabalho»

 

Desportivo: A equipa ainda não tinha perdido e nada fazia prever este desfecho. O que se passou?
Nuno Borges: Desde o início da época que sentimos que isto poderia acontecer. No entanto, pensámos que podíamos mudar o rumo dos acontecimentos.
Iniciamos o campeonato e não tínhamos fisioterapeuta, e ainda hoje o clube não tem, não tínhamos bolas, não tínhamos equipamentos para treinar e não tínhamos pessoas que nos acompanhassem no dia-a-dia para que expuséssemos os nossos problemas.
No entanto, a equipa técnica e alguns jogadores, tentamos que isso não se transportasse para o balneário e para dentro do campo. A verdade é que conseguimos, como demonstram os resultados. Mas o pior era a sombra que tínhamos permanentemente nos treinos e nos jogos, com o investidor (António Fusa) sempre a questionar porque jogamos desta forma e não de outra, porque escolhíamos este jogador e não aquele. Pensamos sempre pelas nossas cabeças e não nos deixámos influenciar.

-Mas as coisas pioraram ainda mais?
-É verdade. o copo transbordou no último jogo com o Merelim S. Paio, onde para nosso espanto estava um treinador na bancada a tirar notas do jogo e a dar indicações para dentro de campo, como se fosse ele o treinador.
Na segunda-feira, não houve treino e essa pessoa, como a autorização do investidor, dirigiu-se às instalações do clube e falou com o grupo da comunidade brasileira comunicando-lhes que seria ele o treinador.

-Mas vocês ainda não tinham sido despedidos?
-Não, nunca ninguém nos disse nada. Foi tudo feito nas nossas costas.

-O que se passou depois?
-Na terça-feira, reunimos com o investidor e nem sequer tocámos nesse tema. Conversámos, sim, sobre uma situação também ela muito grave, pois ele queria que nós alterássemos a convocatória do jogo com o Merelim S. Paio. Isso foi dito em plena sede do clube. No dia a seguir ligaram-me a perguntar o que se passava.  Nesse mesmo dia os capitães também foram falar com ele, pois ainda não tinham recebido qualquer ajuda de custo. Depois, o Talaia ligou-me a dizer que se ia embora e disse-me que o Fusa disse que estava arrependido de não nos ter despedido há meia hora.
Como não quero andar num manto de mentiras, liguei-lhe para termos uma reunião na quinta-feira e convoquei o Presidente da Junta, César Gomes, que é uma pessoa muito próxima dele e que está a tentar que o clube cresça e espero que continue. No entanto, estava iludido, depois de ouvir o que ouviu a opinião dele mudou. No entanto, neste momento, o Palmeiras está preso a assinaturas, a não ser que de uma vez por todas ele desista e vá para o Brasil, o que não me parece.
Nessa reunião colocámos tudo em cima da mesa e decidimos vir embora, bem como os 10 jogadores que nos acompanharam, porque não queríamos estar num processo de aldrabices constante onde o investidor quer fazer o papel de presidente, director desportivo e treinador. Isso não podemos aceitar.

-Isso foi um sinal que o grupo estava unido?
-Os capitães- Xavier, Filipe e Talaia foram empurrados para fora do clube. Ao Talaia queria-lhe baixar a ajuda de custo. Quando o Filipe se lesionou, no início da época, perguntou-lhe se essa lesão já não vinha de outros clubes e se eles não estavam interessados em ficar com ele. Depois  implicou com a idade do Xavier, quando ele sabia perfeitamente a idade dele quando assinou pelo Palmeiras.

Os portugueses, e os próprios brasileiros, estavam a chorar quando nos fomos despedir. Isso é uma demonstração que tinha o plantel unido. É um grupo no qual me orgulho imenso em ter treinador.  O Palmeiras tinha uma equipa belíssima para subir de divisão se nos deixassem.
Infelizmente, existe uma única pessoa que não quer. Quer mandar clube. Ele disse-me que era o dono do clube.

-Não saíram por questões financeiras?
-Não saímos pelo dinheiro, mas sim pelo facto de ele se intrometer no trabalho da equipa técnica e faltar ao respeito aos jogadores. Quero deixar claro que o Nuno Borges, o Ricardo Teixeira e o André Cacheina, mais os 10 jogadores, se o António Fusa sair segunda-feira, na terça voltamos ao trabalho.

-Está arrependido de ter ficado no início da época?
-Não. O futebol é um meio em que isto pode acontecer e também nos faz crescer. O quer deixo é um apelo às pessoas que mandam nos clubes: não partam para soluções que parecem ser as mais fáceis e que depois se transformam num “bicho de sete cabeças” que é isso que está a acontecer ao Palmeiras, que atravessa um período complicado em termos financeiros e esses senhores aproveitaram-se disso. Deixo o Palmeiras em primeiro lugar, o que não acontecia há 15 anos. Outros projectos vão surgir.